A palavra é: Autonomia.

Artigo publicado originalmente no Jornal do Tocantins no dia 21/03/2009.
Ederval C. Rocha

Na quarta-feira comemorou-se o Dia da Autonomia, lembrando o alvará de 18 de março de 1809, emitido pelo príncipe regente D. João VI. Documento este que separava a capitania de Goiás em duas comarcas, a do Sul e a do Norte. Pela primeira vez a data não é lembrada com um feriado estadual, em função de um projeto de lei aprovado pela Assembléia Legislativa do Estado, de autoria do Dep. Estadual Ângelo Agnolin. As motivações que levaram a esse projeto não vem ao caso neste momento, esta lembrança inicial a data é apenas para fazer uma contextualização sobre o tema que ouso tratar neste espaço. A palavra é “autonomia”.
Recentemente fui convidado a falar com um grupo de estudantes do ensino médio do CEM de Palmas, a convite da professora Gleiva Giuvannucci, sobre o 18 de março, Dia da Autonomia. Agradecido pela deferência, apresentei-me diante dos ouvintes não para uma palestra, mas para um momento mais descontraído, um bate-papo informal, as informações que apresentei não continham nada de muito inédito para os alunos, o objetivo verdadeiro é que elas servissem apenas para instigar uns e outros às perguntas.
Enquanto preparava os tópicos a serem abordados, olhando para a tela pequena do computador, me cresceram algumas indagações comuns àqueles que se aventuram pelas humanidades e resolvi então iniciar minha fala diante dos alunos com um desafio: me expliquem o que significa autonomia.
Meu objetivo era perceber como aquelas pessoas, em especifico, definiriam autonomia. Aquelas pessoas as quais me refiro são alunos durante a noite, mas nas manhãs e tardes, são trabalhadores, pais e mães que, como milhões de outras pessoas, “se viram” para findar o ensino médio que, para algumas daquelas pessoas que estavam ali na minha frente, significa o fim da linha no processo de formação educacional. Apareceram muitas definições, mas a maioria ficou entre “fazer o que quero” e “trabalhar sem patrão”, alguns arriscaram “liberdade”. Não pude ficar muito tempo nesta conversa, pois tinha que chegar ao tema principal, mas em casa fui pensar mais sobre o assunto e me pus a escrever, entretanto deixei de lado o aspecto político-administrativo do termo.
Na construção da palavra temos dois radicais gregos: auto = por si só e nomia = lei, podemos concluir então que autonomia é aquilo ou aquele que segue as próprias leis. No dicionário encontramos, entre tantas definições, direito de um indivíduo tomar decisões livremente; liberdade, independência moral ou intelectual. Na filosofia encontramos em Kant, filósofo alemão (1724-1804), a disposição apresentada pela vontade humana de se autodeterminar segundo uma legislação moral por ela mesma estabelecida, livre de qualquer fator estranho ou externo com uma influência dominadora, tal como uma paixão ou uma inclinação afetiva irreprimível, meio complexo, não é?
A construção de uma autonomia se dá a partir da realização de atividades pensadas. As decisões que tomamos no dia-a-dia são frutos de uma racionalidade construída com base na vida social que edificamos ou que nos é permitida edificar. Explico vida social como às relações que o individuo desenvolve ao sabor de suas práticas cotidianas, seja em casa, na rua, no trabalho, na escola ou em outro cenário qualquer onde esteja envolvido com demais sujeitos. Desta forma, estas práticas só existem quando nos são dadas as condições necessárias ao convívio comum, com direitos e deveres comuns respeitados, ao trocar experiências o sujeito vai formando sua capacidade de tornar-se autônomo, quanto mais participação mais aptidão à autonomia. Não é difícil de concluir que, ao ser privado do convívio comum, o individuo também é privado de sua autonomia.
Em uma grande parte do planeta, mesmo em países ditos desenvolvidos, encontramos muitos indivíduos com imensas dificuldades de se tornarem autônomos. Não porque não tenham as qualidades morais, a inteligência necessária, mas porque estão em condições de vida, sob os aspectos do trabalho e da subsistência, em que é difícil ser autônomo. A autonomia do sujeito e a aceitação de suas ações estabelecem-se sobre trocas realizadas em condições sociais específicas, as condições sociais adversas como pobreza, miséria, abandono e injustiça, em que grande parte da população brasileira vive, são obstáculos que dificultam e até impossibilitam a autonomia. Em geral a pobreza econômica esta imediatamente relacionada à situação de pobreza cultural, o que destrói a capacidade de exercitar sua autonomia como cidadão. Afastados de uma boa formação, não conseguem estabelecer-se como sujeitos no contexto social por não terem condições iguais de relacionamento e não terem condições iguais para disputar as oportunidades, inclusive de emprego. O exercício da autonomia opõe-se a toda e qualquer forma de abuso ou desmando, a qualquer forma de abandono e marginalização, situações que minam a autodeterminação, coagido por algo que é alheio à sua vontade.
As condições sociais desfavoráveis limitam o poder autônomo, tendo em vista que a este engloba tanto a liberdade de dar a si os próprios princípios, quanto a capacidade de realizar os próprios projetos. Uma pessoa com autonomia diminuída, de outra parte, é, pelo menos em algum aspecto, controlada por outros ou é incapaz de deliberar ou agir com base em seus desejos e planos.
Ederval C. Rocha - Professor do Colégio Ulbra Palmas e CEULP/Ulbra. Mestrando em Desenvolvimento Regional Universidade Federal do Tocantins
edervalcr@gmail.com

Comentários

Gilmar JUNior 2 "A" disse…
é preciso dizer que autonomia significa "que ou quem se governa". Por isso, em contraposição às organizações hierárquicas e autoritárias, as mobilizações dos grupos autônomos têm sempre o indivíduo como protagonista.


Aluno-Gilmar Junior 2"A"

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